Desabafos p’las Annapurnas: IV e V

-Tilicho Base Camp-

(4150m)

14/10/2017

Há dias que temos ideias loucas, e hoje foi um deles.

O plano era fazer 35 km num só dia e assim retirávamos 1 dia à caminhada. Estava louca quando achei que era possível, aliás estávamos todos loucos, porque através da leitura do mapa parecia possível, esquecemo-nos foi do problema da altitude e que estávamos a 3500 metros e teríamos de ir até aos 5000m e voltar.

Sim podem chamar-me de louca.

O plano foi o seguinte:

Deixar o peso todo numa guest house em Khangsar e ir até ao lago e voltar (total de 35 km). A meio do caminho para o campo base (onde acabaríamos por ficar a dormir) apercebi-me que não era possível chegar até ao lago, era muito longe e este caminho eram todo de desfiladeiros, um passo em falso e escorregava pela montanha a baixo (perdia a vida para ser realista).

Reformula-mos a decisão ficaríamos no campo base do Tilicho a aclimatar à altitude e no dia seguinte subíamos ao lago e regressávamos a Khangsar onde tínhamos as malas.

Durante o trekking podemos ver vários avisos com os cuidados a ter com a altitude e os sintomas (dor de cabeça, tonturas, vómitos e febre), em casos extremos pode levar á morte. Assisti a um resgate de helicóptero, e ainda um senhor que mal se conseguia suster em pé, caminhava como se estivesse super bêbado. Vou ser sincera estou com medo de não conseguir chegar ao lago que está a 5000 m.

Chegámos e havia 1 quarto com uma cama de casal livre (nós somos 6), havia a opção de 3 pessoas ficarem na sala comum a dormir no chão, mas como somos um grupo unido decidimos enfiar 6 pessoas num quarto minúsculo. As 3 mulheres na cama e os 3 homens no chão, com o frio que estava o calor humano ajudou a que todos dormíssemos bem!

Depois de um dia delicado como o de hoje já só quero descansar, estou ansiosa para o dia de amanhã! Chegada ao lago mais alto do mundo de acordo com o seu tamanho!!!!

– Tilicho Lake- 27km

15/10/17

Às 5h estava de pé, tinha que subir cedo para não apanhar muito vento e ter tempo de regressar.

Eram ‘’apenas’’ 5 km, que sobem 1000m de altitude, há quem os faça em 3h, 4h e até em 5h.

Fiquei-me pelas 3h, mas 3h que me pareceram uma eternidade.

A falta de oxigénio na subida era notória desde o primeiro passo. Uma subida íngreme que parecia não ter fim é uma luta e um desafio constante, quer físico quer mental. O meu objectivo era chegar ao lago e a dificuldade por vezes leva à desistência (haviam pessoas a descer). Nunca o pensei fazer porque o sonho estava no topo daquela montanha, estava cada vez mais perto a cada passo, a cada respiração.

No meio de tanto frio estava espantada com a beleza natural do lago a 5000m de altitude! Lindo Lindo Lindo.

Queria ter ficado lá, mas o frio gelava e o vento apareceu.

Já posso dizer que estive no lago mais alto do mundo de acordo com o seu tamanho, e é incrível.

Ali estava ele, intocável, grandioso. Que beleza.

Eu estava orgulhosa de ter ali chegado, há tanto que esperava por aquele momento. Depois de tanto esforço ali estava eu a erguer a minha bandeira. Com orgulho.

A regressar não contive as lágrimas deparei-me com uma panorâmica dos himalayas, deparei-me a realizar um sonho, deparei-me exausta mas tão feliz.

Depois da subida mais difícil vem a vista mais bonita, e de facto nunca tinha visto nada tão natural e virgem à mão do homem.

Estou exaustivamente feliz.

Em 1h30 desci, a descer todos os santos ajudam! O oxigénio voltava à medida que descia mas uma grande dor de cabeça acompanhava-me.

Cheguei quase sem forças ao base camp e ainda tinha uma longa etapa pela frente.

Almoçámos e fomos.

Tínhamos que regressar a Khangsar onde tínhamos deixado as malas no dia anterior, 18 km pelas derrocadas, foi um desafio enorme e parecia que nunca mais chegava, uma dor de cabeça que não me largava e passos que custavam a dar.

Ninguém disse que cumprir sonhos era fácil.

Estou orgulhosa de mim, quero continuar a palminhar montanhas e a superar-me todos os dias. A superação pessoal trás resultados e mostra algo que nunca tínhamos visto em nós.

Desabafos p’las Annapurnas: II

12.10.2017

”Sou as pessoas que conheci”

Dou por mim a ver os dias passar num ápice e a não conseguir agarra-los, estar no meio desta imensidão enche a alma e completa tudo o que um dia aqui faltou.

Cada dia compreendo mais a magia dos himalayas a paz e a força da natureza que é algo intocável e inigualável.

Esfrego os olhos e pergunto-me se é real.

Como iniciei só esta viagem e terminei junto de 5 pessoas fantásticas.

Reencontrar algo que havia perdido está a poucos passos de distância, agora é alimentar todas estas boas energias e pensamentos e espalhar, partilhar com os outros, que tal como eu tenham a oportunidade de sonhar alto e de se realizarem. É tão bom quando podemos partilhar sorrisos e sonhos é tão bom sentir felicidade e paz no ar.

Se cada um escalar a sua montanha da vida aproveitando cada passo, sairá mais rico e de energias renovadas.

A minha montanha está a ser esta, mas em cada lugar há um sítio especial à nossa espera, temos simplesmente que sair, parar, olhar, sentir e entregar-nos ao mundo de alma despedida.

-Upper Pisang-

(3200 m de altura)

Até ao próximo desabafo 🙂

Desabafos p’las Annapurnas: I

O blog esteve parado, eu estive parada, no meio da rotina, das aulas e de Katmandu não tinha vontade de escrever.

Regressei, e em força.

Iniciei uma caminhada, esperava por isto desde que me lembro. Sabem aqueles sonhos que estão escritos algures em papel do que fazer antes de morrer? Pois bem fazer uma caminhada nos Himalayas era um dos meus maiores sonhos!

Partilharei com vocês excertos do meu diário, onde cada dia pela noite desabafava o que sentia e os frutos do dia.

Espero que gostem e acompanhem este percurso que foi um mais que um sonho e que vocês próprios se envolvam com a magia dos Himalayas.

10.10.2017

Hoje cada passo que dava era dado cheio de motivação, fui acolhida pela grandiosidade da Natureza e nunca tinha visto nada igual.

Estou tão feliz por estar aqui e tão realizada, atirar-me de cabeça para este trekking fez com que novas ideias surgissem, fez com que ganhasse ainda mais motivação para a viagem que aí vem, fez-me sentir que o destino guarda-me coisas maravilhosas e insistir na auto-realização vou crescer em cada experiência vivida.

Tenho o coração livre e recheado de boas energias. Dou por mim a sorrir para as montanhas, para as cascatas, para os animais e para o céu onde tenho lá os avós que olham por mim e me acompanham.

Sei que depois de uma subida vem algo maravilhoso, cada gota de suor, cada passo, cada dor muscular é a junção para um tipo de felicidade que por vezes está escondida e tende em ser difícil de ser encontrada.

Estou no meio da mãe natureza e não há nada mais puro que isto.

Eu e as montanhas!

Que montanha da vida é a minha!

Local: Danagyu

Km’s percorridos: 22km

Marta Geadas Durán